Entre Amigas

Capítulo 08

Eu acho que a minha vida se divide em antes de depois da sacanagem que a Dri fez comigo. Antes eu era boba, tratava meus amigos como eu gostaria que eles me tratassem, e procurava sempre agradar a todo mundo. Mas percebi que nada disso era recíproco. Agora eu estava mais esperta, não saía contando as coisas logo de cara para todo mundo, esperando desesperadamente que alguém se importasse com a minha vida, com os meus sentimentos. Eu estava simplesmente ali. Se me dissessem bom dia, eu respondia bom dia. Tudo que falavam era lindo e maravilhoso. Assim, aos poucos, eu fui desencanando de tudo o que aconteceu.

A única coisa que realmente pegava, era o Nando. Ele cumpria à risca as determinações da Dri. Enquanto ela falava comigo como se nada tivesse acontecido, ele não olhava para minha cara, não falava comigo, era como se eu fosse uma completa estranha. Isso sim me magoava, afinal ele foi meu primeiro beijo, e não é bem assim que a gente imagina que as coisas vão rolar, depois da tão esperada ocasião. Eu não sei, mas no fundo eu ainda queria que um dia eu tivesse a oportunidade de esclarecer a verdade a ele. Talvez para ele isso não fizesse diferença, mas para mim fazia, e muito. E agora ele e a Dri estavam namorando, aparentemente firmes, exceto quando ela dava as puladinhas de cerca dela. Por mais que eu tentasse não ligar para isso, no fundo eu achava bem feito que ele tomasse chifre, pois foi decisão dele acreditar na fofoca e ficar com ela ao invés de mim. E eu também sabia, pelo Doug, que ela vivia tomando chifre. Então, no meio de tantos sentimentos divididos, eu me sentia aliviada por não ser EU que estava nessa situação.

Mas eu ainda me sentia vazia, e principalmente agora, que eu já sabia, pelo menos mais ou menos, como que era um beijo, eu sentia vontade de ter um namorado. A Nessa tava namorando, a Dri também, a Rê ainda tava de birra comigo, por causa do lance do Nando, mas ao mesmo tempo ela tava mais pê da vida com a Dri do que comigo, então eu estava me sentindo meio que sozinha, e achei que eu precisava de duas coisas: de novos amigos e de um namorado. Novos amigos seria meio difícil, porque o maior problema de se estudar por tanto tempo no mesmo colégio, é que você acaba conhecendo bem todo mundo, e esse todo mundo é amigo, não dá pra atravessar aquela tênue linha que separa a amizade da paixonite sem ter grandes conseqüências, pelo que já aprendi com o caso Nando. Se fosse pra namorar alguém, teria que ser alguém de fora da escola.

O fato é que, estava tudo bem, mas não estava ao mesmo tempo. Não sei se é porque eu ficava repetindo pra mim mesma que estava tudo bem, esperando que realmente tudo ficasse bem, como num passe de mágica, ou então estava tudo bem mesmo, e eu não estava enxergando isso, então era necessário repetir várias vezes, pra me conscientizar.

Aquele dia eu fui andar um pouco, estava cansada de estudar pra uma prova ferradíssima que teríamos no dia seguinte. Não tinha ninguém pra conversar, nada novo pra fazer, a não ser estudar, então eu sentia que a minha vida estava estagnada. No meio do caminho, encontrei o Marcelo.

Marcelo: E aí, sumida?
Débora: Você que sumiu! Só queria saber da sua namorada mais velha, nem lembrava mais dos amigos, né?
Marcelo: Pô, nem me fale! Tomei mó pé na bunda!

Eu não fiquei feliz, mas de certa forma foi bom saber que tinha mais alguém se sentindo um lixo, e não apenas eu; que essas coisas acontecem com todo mundo e não apenas comigo.

Ficamos um tempão conversando sobre namoros, sobe beijos, sobre viagens, sobre computador, cinema, livros, escola, e a conversa dava tanta volta, que eu nem percebi quando anoiteceu. O Marcelo achou melhor me acompanhar até em casa, porque já estava escuro, e quando finalmente chegamos, a coisa mais doida que eu poderia imaginar, aconteceu:

Marcelo: Quer saber? Você não deve ficar assim, não por causa daquele babaca do Fernando, nem da piranha da Adriana.
Débora (rindo): Nossa, você ainda se lembra desse assunto?
Marcelo: É, meu, porque olha só: aquela Adriana é uma nojenta. Eu ODEIO quando ela vai em casa. Ainda bem que agora ela e a Rê andam de malzinho, e ela não aparece mais por lá. Esse Fernando é um idiota, metido a músico, mas pra mim, no fundo no fundo, ele é gay.
Débora (rindo mais ainda): Ai, Marcelo, só você pra me fazer rir!
Marcelo: Mas é verdade! Escuta o que eu vou te falar: até vocês se formarem esse carinha vai sair do armário, fica de olho!
Débora: Pode deixar...
Marcelo: E tem outra, também: se ele não te valorizou, você tem que ficar com quem te valoriza.
Débora: O problema ta sendo esse: encontrar essa pessoa.
Marcelo: Talvez você esteja procurando no lugar errado, ou talvez esteja procurando demais. Às vezes é só deixar rolar, que as coisas se encaixam sozinhas.
Débora: É, você tem razão. Nada como conversar com alguém mais experiente para achar uma luz no fim do túnel.

E então aconteceu! O Marcelo me beijou!!!!! E, que nunca tinha beijado antes, em algumas semanas tinha beijado 2 garotos diferentes! Naquela hora eu não senti vergonha, nem medo. Não senti vontade de correr depois que o beijo acabasse, nem me preocupei em como olhar para ele no final, o que dizer, nem nada, porque tudo parecia absolutamente perfeito e certo. Eu considerei ESSE como o meu primeiro beijo MESMO. Não sei quanto tempo durou, porque na verdade parecia que tudo tinha parado, que não existia mais nada no mundo, apenas eu e o Marcelo. Não pensei em como seria se a Rê descobrisse, o que a Dri iria achar, não lembrei nem de Nando, nem de Nessa e Doug... Aliás, nem do meu pai eu me lembrei, e quase que ele nos pegou no flagra! Eu apenas fechei os olhos e curti cada momento. Então o Marcelo segurou meu rosto, olhou nos meus olhos, passou a mão no meu cabelo e falou: “boa noite!”. Aí eu fiquei parada na porta de casa, olhando ele ir embora.

Naquela noite eu nem jantei. Fui pro meu quarto e fiquei relembrando cada momento daquelas últimas horas PERFEITAS. Dormi muito bem, como há tempos não dormia.

No dia seguinte, entrei concentrada na escola, por causa da prova, estava calada. Só a Nessa percebeu e me perguntou se eu estava bem. Apenas disse que estava concentrada na prova. Agora eu entendo porque a Nessa e o Doug fizeram segredo quando eles ficaram. Não é que eu não confie neles, mas está tudo tão perfeito, que eu tenho medo que algo errado aconteça e estrague tudo.

Fui muito bem na prova, e na hora do intervalo eu não queria papo com ninguém, então dei uma desculpa de que precisava fazer uma pesquisa, e fui me esconder na biblioteca. Peguei um livro qualquer, e fingia ler, quando na verdade apenas relembrava os melhores momentos da noite anterior. Estava tão concentrada em minhas recordações, que tomei um baita susto, quando senti uma mão nos meus ombros:

Marcelo: Nossa, finalmente te achei! Realmente, a biblioteca é o melhor lugar pra se esconder. Espero que não esteja se escondendo de mim...
Débora: Claro que não estou me escondendo de você! Eu só não queria falar com as meninas. Sei lá, queria ficar na minha, sabe?
Marcelo: Ô se sei!

O Marcelo olhou para um lado, olhou para o outro, e me deu um selinho.

Débora: Hei, aqui não! Alguém pode nos ver!
Marcelo: Hum, você não contou pra ninguém sobre ontem?
Débora: Não.
Marcelo: Por que?
Débora: Ah, sei lá... Ta tão legal assim, não quero que nada estrague.
Marcelo: Sei o que você quer dizer. E concordo! Então que tal hoje a tarde, no mesmo lugar que a gente se encontrou ontem?
Débora: Combinado!

E foi assim que todos os dias, a gente se encontrava, depois da aula, e passávamos ótimos momentos conversando, rindo, às vezes estudando e, é claro, beijando. Tudo isso sem ninguém saber.

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